Um toque de magia
“Querido Menino Jesus…”. De caligrafia irrepreensível e mão
trémula, os deditos iam deslizando pela folha pautada. Contida nos pedidos, mas
transbordante de emoção, a carta lá saía... e desaparecia misteriosamente, quem
sabe levada por renas voadoras ou uma estrela a caminho de Belém. Até ao dia
25, a dúvida permanecia e a expetativa crescia. Será que me portei mal? Terei
mesmo a boneca que diz mamã? Como é que Ele vai saber que eu moro aqui? Chegada
a noite da Consoada, com o coração aos saltos, punha o sapatinho na chaminé (a
mesma onde ainda hoje coloco a bota!) e arrastava-me para a cama, ensonada mas
sempre alerta ao mais pequeno ruído (que, diga-se, nem quando o meu avô
resolveu experimentar a viola por embrulhar, consegui ouvir). E na manhã do dia
de Natal, entre os presentes que rodeavam o fogão, ela lá estava: a carta que
eu escrevera ao Menino Jesus. Magia!
Os tempos passaram e o espírito de Natal (nunca é demais
recordar) tem vindo a ser esquecido, senão mesmo usurpado, por um consumismo
desenfreado e um esvaziamento de significados. E até os meninos e meninas
deixaram de escrever cartas e pedir desejos, preferindo apontar para as montras
ou folhear os catálogos dos supermercados. Bom, todos não: a Matilde pediu ao
Pai Natal uma boneca de pano com cabelos dourados, vestido de papoilas e cheiro
a bolo de chocolate e canela. “Não se vende em lado nenhum, mas talvez os
duendes consigam fazê-la!”, escreveu. E não é que conseguiram? E foi assim, com
o seu sonho tornado realidade, que conseguiu devolver a magia a todos os
meninos e meninas que tinham deixado de sonhar. É apenas uma história , mas bom
seria que a conseguíssemos transpor para a realidade e que pudéssemos semear
por aí umas quantas Matildes capazes de “contagiar” as crianças. Porque Natal
sem magia não é Natal. E só a fantasia nos deixa sonhar.
E, já agora, porque não aproveitar a quadra da ilusão por
excelência para estreitar laços, partilhar dádivas e renovar valores? Afinal,
mais que uma festa caseira de troca de presentes e mesa farta, o Natal – ainda
para mais nos tempos difíceis que correm - deveria ser a época para espalhar a
paz, a esperança e a solidariedade. E para mostrar que, com o coração aberto e
o toque de uma varinha de condão, todos os meninos e meninas podem ter um Natal
a “cheirar” a canela. Como? Magia!
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